Eu nunca serei yo |
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Um caderno de trabalho de Séchu Sende
A minha obra neste caderno está licenciada baixo creative commons, copiceibe.
O autor solicita comunicar-lhe qualquer uso ou modificaçom da sua obra no email de contacto aqui sinalado. |
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O monstro de Guatemala |
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Eu tinha vinteseis e eram as festas do verao. Fora viver áquela vila onde nom conhecia ninguém precisamente por isso, porque nom conhecia ninguém. Recordo que aquel dia merquei um livro num posto ambulante que havia ao lado dumha tómbola. O livro, de Jack London, tenho-o na mao, tantos anos despois. Uns desenhos preciosos.
Recordo que foi mercar o livro e apartar-me um pouco da festa para o começar a olhar, acheguei-me á praia e sentei na areia. E que essa noite durmira mal porque, como começava a ser habitual, tivera pesadelos violentos.
- Ola, gostas de ler?- Ela apareceu por detrás e falava portugués, devia ter os meus anos, algo menos talvez. Erguim o livro e ela exclamou Jack London, o meu favorito!
E assi foi como nos conhecemos a equilibrista e mais eu, com A Ilha das Focas na minha mao direita.
Chamava-se Estrela e caminhava sobre o arame desde os quatro anos. Viajava, como num circo, com a sua família de equilibristas, Os Solaris. Actuavam manhá a mediodia. Ao dia seguinte, quero dicer.
- E nunca cansas de viajar?
- E como se di Estrela em croata?
Eu sempre fum mais de fazer perguntas e escoitar que de resposta-las e falar. Som umha persoa pouco faladora.
-E ti viches o monstro de Guatemala, nom si?- perguntei-lhe.
O monstro de Guatemala era umha das atracçons das festas, a que mais intimidava as crianças: O mons-tro de Gua-te-ma-la!!!
-É amigo meu, dixo.
- Amigo teu?
- Ahá.
- E como é isso de ser amiga dum monstro?, perguntei-lhe.
- Bah, é umha pessoa como outra qualquer? Nom sei se poderia dizer o mesmo de todos os monstros? Se nom o viches, achegamo-nos á sua carpa e convido-te?
E alá fomos.
Nunca esquecim aquela voz a saír dos altofalantes, umha voz profunda como de voz em off de filme de série B de terror, grave e com ecos, anunciando-o misteriosamente: O monstro de Guatemala?mala, mala. Recem chegado do terremoto de Guatemala!, vomitado polas profundidades da terra! Aqui, entre nós, nom perdam a oportunidade de contemplar O monstro de Guatemala?mala, mala!
Ela colheu-me da mao e entrei da mao da equilibrista na carpa do monstro de Guatemala com umha seguridade que nem antes nem despois volvim ter.
Saímos da mao, rindo com lágrimas nos olhos, e daquela foi quando lhe perguntei se me deixava convidar a mim e se queria ir ao Safary Park, o da voz que anunciava Natureza selvagem, Lobos, osos e bestas feroces!.
Mas ela deu um passo atrás, e dixo Nom.
- Nom soporto a crueldade nem a violéncia. E aí dentro todo é inhumano. É a cousa mais inhumana que poidas imaginar. Animais em gaiolas, angústia, maus tratos? Entrei umha vez há anos e com o recordo vem umha náusea que se converte em rábia. Havia dous lobos e um oso, e vários mandris fechados e caminhando em círculo constantemente, loucos? O coidador é umha persoa ruín que bate seguido nos animais com umha barra de ferro? bate neles, bate, bate, a dor, sabes? Ao oso já lhe rompeu vários ósos? Esse si que é um monstro?
- Gostas das orquestras?, perguntei-lhe.
No campo da feira havia milheiros de persoas. Achegamo-nos ao palco da orquestra abrindo caminho entre a gente, a equilibrista levava-me da mao e avançavamos, com umha curiosa facilidade, como um coitelo a abrir caminho na manteiga.
Bailamos umha lenta e abraçamo-nos e voltamos á praia, ver a lua sobre o horizonte.
- Sabes, os nomes das persoas da minha família, desde hai muitas geraçons, som nomes de corpos celestes. Meu pai é Júpiter, como meu avó, e meus irmaos Sol, Libra, Plutom e Mars.
- Por que?
- Porque sabemos estar aí arriba? Se umha estrela caesse do céu seria a fim do mundo, nao é?
- E o perigo?
- Quase sempre actuamos com rede. Mas quando é preciso?, quando necesitamos demostrar quem somos, a rede sobra. Por isso minha mae aprendeu-me as sete palavras para nom cair? Antes de dar o primeiro passo no arame sempre as pronúncio: Eu nom som umha estrela. Som umha mulher. Adiante!
- ?
- A noite que ela morreu, em Barcelona, era umha dessas noites especiais. E eu mirei-na cair como umha estrela fugaz?. Lembro a estela prateada do seu vestido de espelhos....
- ?
- Só existe umha forma de me fazer perder o equilíbrio?,- dixo um pouco despois.- Vou-cho contar porque confio nas persoas que tenhem livros de Jack London? Se entre a gente do público, lá abaixo, alguém, umha só persoa, soprar com toda a sua força enchendo e vaciando os seus pulmons para a mim quando estou a caminhar no arame,? a força dessa brisa humana pode tumbar qualquer equilibrista? Esse sopro pode desquilibrar um funambulista com a força dumha turbuléncia que bate contra um aviom.
- Queres vir á minha biblioteca e escolher um livro e Jack London? Tenho 37.
- 37 livros de London! Meu bisavó foi o primeiro que cruçou de lado a lado numha corda tensa o salto de Iguazu. Penso que ir á tua biblioteca nom pode ser mais perigoso?
- Claro que há ofícios mais arriscados?,- explicou-me no elevador-. As estatísticas dizem que há mais mortes nas famílias de lançadores de coitelos? Por certo, tu em que trabalhas?
- O que?
- Em que trabalhas?
- Nom pareço um funcionário?
- Vaia, nom debe ser muito emocionante, nao e? Pronto! Só tes livros de Jack London!!!! -exclamou diante dos volumes.
Eu encolhim os ombros.
E ela escolheu Moolai, o leproso, umha ediçom com umhas ilustraçons magníficas á aguarela, e achegou-se ao balcom. Um décimo andar.
- Nom me explico como a gente pode viver a tanta altura? Nom é natural, dixo, e botou-se para atrás?-
- Tes vertige!?
- Tenho?, fora do arame.
A mediodia na alameda havia tanta gente para ver os funambulistas como na verbena da noite anterior. Sabiamos que probavelmente nunca voltaria pola nossa vila um espectáculo como aquel. O arame atravessava o paseo da alameda por riba das palmeiras, os plátanos e o jardim, e alá arriba a família de equilibristas Solaris, que cruçaram Manhattam caminhando sobre arames tendidos entre 24 prédios, saudavam-nos respectuosamente com as maos, a cámara lenta.
- Sabes quantos ósos rompím caíndo do arame?, - dixera-me antes de ficar durmida a noite anterior- O primeiro aos seis anos, este, -sinalou a tíbia da perna direita-.
- Seis? Sete? Mais?
- 17.
- A clavícula, 3 vezes. Se nom fosse equilibrista? Sempre sonhei com ser médico. Traumatóloga. Sempre que rompia um óso, em Roma, em Croácia, onde for, as persoas que me atendiam vestidas com batas branquíssimas convertiam-se nas persoas mais importantes da minha vida? Delas dependia que voltasse a caminhar ou a escreber ou a ser eu mesma, dixo levando a mao á cabeça. Em fim se tivesse a oportunidade gostaria de ser umha dessas persoas que arranjam os ósos rotos?
- E este livro? Como começa?, perguntou ela.
- Como?
- Como começa o livro? Sempre gostei mais dos princípios que dos finais?
- Daquela nom pensas que é melhor que nom che diga nada?
Ás doce vim como Estrela saudava no alto da andamiagem metálica a mais de vinte metros de altura, com um vestido vermelho, com as outras seis persoas da sua família que erguiam as maos para o céu. Juntos, vestidos de diferentes cores, era como se formassem um arco da velha.
Com os olhos entreabertos vim que antes de dar o primeiro passo Estrela livrava dos lábios aquel poema: Eu nom som umha estrela. Som umha mulher. Adiante!
O arame sobre o que pissou apenas era visível debaixo do seu pé esquerdo. E quando chegou a néboa, de súbito, Estrela com o seu vestido vermelho semelhava caminhar de veras sobre o ar, no céu azul e branco. Olhei a gente que, abraiada, fitava para arriba deixando entrar a néboa nas suas bocas abertas pola admiraçom.
E si, claro que o pensei, pensei, e se agora sopro? E se agora soprasse, pensei, poderia faze-la cair?
Olhei outra vez o público com medo de que a alguem, a um neno, por exemplo, se lhe ocorrese soprar.
Quando chegou ao outro lado do arame e recebeu os aplausos e bravos do público e olhou cara abaixo para saudar eu imaginei que me estava a buscar a mim entre a gente e por isso colhim o meu carro e marchei longe.
Imaginei-na esperando por mim despois do espectáculo e achegando-se ao meu edifício e chamando ao timbre repetidamente e olhando para arriba o balcom baleiro do décimo andar.
Nunca lim um livro de Jack London. Merco os livros polos desenhos de aventuras e violéncia. Eu nom leo.
E nunca mais voltei a ver a Estrela, fóra dos sonhos e dos pesadelos. Nos sonhos beijo-a delicadamente.
Nos pesadelos Estrela sempre é umha manifestante vestida de vermelho que aparece de súbito no médio dumha carga e eu bato nela, bato nela, bato nela nas pernas, nas costas, nos braços, e crac, rompo-lhe um óso.
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Tominho, 2010 |
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13 Comentário(s) |
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Pues la historia es bastante interesante, asi que te agradezco q#blgtk08#ue la hayas puesto por aqui para que nos podamos enterar todos! |
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Comentário por Mascotas (20-06-2011 12:02) |
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Eu lembro-me tam bem do monstro de Guatemala (a minha prima dizia "de Guatemálaga", coitada!). Tinha um só olho na fronte, e cheirava a Madroa. Eu sentia como o medo se apoderava do meu corpo quando me fitava directamente a mim, sem dúvida a mim, que estava -como nom- na primeira fila!Antes do monstro de Guatemala vinhera a mulher-aranha, recém-chegada do Amazonas, que comia carne humana e que tanto nos assustou a todos (com tam só dous canais de televisom e emissons que acababam tam cedo, era normal). #blgtk08#Despois do monstro ainda chegárom, sempre com os desenhos da entranhável aracnídea na lona da carpa, o home salvage, pendurado das tranças e cheínho de pêlos, e mais o home-tartaruga, que sacava a cabeça pola concha envernizada, com aqueles cabelos-Carbonell, a duas águas e com o carreiro bem traçado no meio, tamém do Amazonas, que dizia, com acento andaluz "Miruhté, mi pare eh un ombre, y mi mare una tot-tuga".
Aquela foi a derradeira apariçom da companhia. Ninguém voltou a saber mais nada dela. |
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Comentário por Suso Moinhos (29-07-2011 15:11) |
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Comentário por North Face Ireland (28-11-2012 04:53) |
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Comentário por Prada UK (29-11-2012 01:20) |
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Comentário por www.sigma-rh-consulting.fr (20-01-2014 08:19) |
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Cámbiam os teus olhos,
os lagartos e os rios.
Cámbiam as ilhas de mar
#blgtk08#e os paxaros, de ninho.
Cámbia de futuro o passado
e o meu país, de caminho. |
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Comentário por http://www.format-factory.fr (30-11-2015 07:30) |
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